Sobre a frase "nascimento é sofrimento"

terça-feira, 14 de junho de 2011


Nota: esse texto tem como base somente minha experiência pessoal recente e não serve como ensinamento de Dharma.  

Com o fim recente e precoce de meu casamento veio à minha mente, juntamente com a dor emocional, a frase "casamento é sofrimento". Essa constatação me parece mais uma variedade da primeira Nobre Verdade declarada por Buddha Shakyamuni:

" Esta é a nobre verdade do sofrimento: nascimento é sofrimento, envelhecimento é sofrimento, enfermidade é sofrimento, morte é sofrimento; tristeza, lamentação, dor, angústia e desespero são sofrimento; a união com aquilo que é desprazeroso é sofrimento; a separação daquilo que é prazeroso é sofrimento; não obter o que se deseja é sofrimento; em resumo, os cinco agregados influenciados pelo apego são sofrimento." -- SN LVI.11

Essa declaração de Shayamuni Buddha muitas vezes é usada para argüir que o Budismo é uma religião pessimista. Em parte devido à tradução mais usual da palavra “duhkha” - sofrimento. Muitos professores contestam essa tradução preferindo outras como insatisfação, desequilíbrio ou desarmonia. Mas é difícil separar o que normalmente entendemos como sofrimento de duhkha, ainda que duhkha tenha um significado mais amplo e sutil. Nesse texto vou continuar usando a palavra sofrimento pois é mais apropriada no sentido que eu quero expressar.

A parte que mais me impressiona na declaração de Buddha Shakyamuni é “nascimento é sofrimento” (da onde muitas vezes a primeira nobre verdade é até expressada como "a vida é sofrimento"). O simples fato de nascer seria sofrimento? Eu entendi um pouco mais dessa frase com a minha experiência de “casamento é sofrimento”.

O casamento pode ser visto como uma vida dentro da vida de uma pessoa. Ela também tem seu nascimento – a cerimônia de casamento. E também tem seu fim – às vezes coincide com a morte física da pessoa – “até que a morte os separe” – e às vezes termina com a separação, como no meu caso. Quando eu percebi que meu casamento havia terminado, senti como se uma parte de mim houvesse realmente morrido.

Tal como o nascimento, é impossível impedir que o casamento acabe – e todo mundo sabe que morte é sofrimento, e a separação daquilo que é prazeroso é sofrimento. Portanto casar invariavelmente implica em pelo menos um grande sofrimento futuro: o fim do casamento. Portanto “casamento é sofrimento”, assim como “nascimento é sofrimento” – basta nascer para que a morte seja inevitável.

Isso significa que casamento e nascimento são somente sofrimento? Que não vale a pena nascer e casar? Claro que não, qualquer um sabe disso. Também há imensa felicidade no nascimento (na vida) e no casamento. Eu fui muito feliz durante o casamento. Porém essa felicidade é intimamente ligada a um sofrimento inevitável, não é independente do sofrimento.

3 comentários:

Tiago Moreno disse...

bom dia, joão

não nos conhecemos, mas sou um frequentador assíduo do seu blog...
o que houve não me interessa, mas entristeço-me pelo fim do seu casamento... separação é sofrimento, indenpendente do motivo...
ao mesmo tempo, fico feliz em ver que encontraste energia e inspiração para novas palavras aqui... sentia sua falta.

Bem vindo de volta, e força

Ana disse...

Oi,

Não conhecia o seu blog e gostei muito dessa sua reflexão.
_/\_

Ana disse...

Oi,
Não conhecia o seu blog, acabei de ler as suas postagens e essa sua reflexão foi bem oportuna.
_/\_